Exposição: Silenciosa, Paciente e Voraz

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S/ título, 2024 (detalhe) © Tiago Rocha Costa

 

Tiago Rocha Costa: Silenciosa, Paciente e Voraz

A exposição Silenciosa, Paciente e Voraz, de Tiago Rocha Costa, abre passagem à curiosidade inata em todos nós. O conjunto de objetos enigmáticos que a compõe dirige-se ao nosso insaciável apetite pela descoberta, pelo fascínio, pela procura de conhecimento e pela expansão das fronteiras do nosso mundo.

O imaginário que aqui se enceta é aquele dos exploradores intrépidos, das expedições a terras distantes, da recolha dos espécimes, da catalogação das espécies e dos gabinetes de curiosidades. Trata-se, pois, de um universo marcado pelo enamoramento da morfologia e pela determinação de diferentes formas orgânicas e inorgânicas — da zoologia, da botânica, da mineralogia e suas respetivas hibridizações, bem como o inesperado cruzamento destas com o legado dos artefactos humanos. Reinventando alguns dos procedimentos da ciência e da história natural — como o apropriar, o conter, o dissecar, o compreender, o inventariar e o sintetizar — o artista concretiza um conjunto de diversas ficções sobre a matéria. Por estas ficções preconizadas pelos gestos do desmontar, organizar, recompor e ressignificar numa prática maioritariamente desenvolvida na tridimensionalidade, Tiago Rocha Costa transporta-nos a lugares geográficos e temporais incertos, aparentemente desconexos, alinhados segundo o manifesto interesse por um outro inteiramente diferente.

O gosto pelo exotismo que daqui ressalta informa-nos sobre um tempo perdido, marcado pela ausência e pelo apagamento das antigas revelações e esplendores, versando, ainda, um comentário mordaz acerca da nossa agência sobre a natureza. Assim nos falam os recortes das aves tropicais, tal como os viveiros, ninhos, cascas ou casulos, abandonados por espécies não identificáveis, e, ainda, os livros e as bibliotecas cristalizadas — como se um manto de âmbar, de areia e de pó, na sua desconcertante quietude, se fizesse estendido sobre uma outrora animada coletânea de sumptuosidades. Esta doce melancolia é, pois, aquela que encontramos na estética da ruína e do romantismo. Uma estética que aqui se faz (como se fez entre os finais do século XVIII e inícios do século XIX), entre a pureza e a corrupção, entre o “exuberante sentido da vida” (1) e a morte, na procura pela “descoberta do método da natureza em si mesma”(2), agora trazida à negociação entre a racionalidade latente ao conhecimento científico e o encantamento pela fragilidade e decadência dos seus sistemas.

As obras de Tiago Rocha Costa aludem ao devir, ao eterno fluxo da natureza e à transitoriedade de todas as coisas. Falam-nos também da luta que desenvolvemos desde os nossos primórdios com o meio e das sucessivas transformações que operámos e continuamos a operar sobre a natureza com a técnica e as tecnologias. As suas menções à circunscrição, encenação e fabricação do natural levam-nos à consideração sobre a desfuncionalização da natureza, bem como do fim da sua ideia enquanto território separado e selvagem, como um mundo além da humanidade para o qual ela se adaptou. Entramos no domínio da nivelação entre o natural e o artificial, entre o selvagem e o doméstico, no qual as leis gerais da natureza parecem coadunar-se à vontade humana. No entanto, por detrás dos olhos da humanidade, a leitura que no conjunto do trabalho do artista nos é sugerida afigura-se radicada no lugar do vencido — à escala planetária, ninguém está isento das consequências da desregrada agência e do ímpeto poderoso, sem desvio nem individualidade, da vontade na natureza. O recalibrar das suas forças traduz-se num combate sem tréguas em várias escalas, do macro ao micro, no fora e no dentro, uma força maior corrói, degrada, cristaliza, transforma e propaga. No conflito eterno e recíproco dos seus fenómenos, a natureza refaz e reconquista o seu lugar, de modo silencioso, paciente, mas voraz.

(1)Berlin, Isaiah (1999), The Roots of Romanticism, Princeton University Press, p. 17. (2) Ibid., p. 27.

Curadoria
Andreia César


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2024-07-06 16:00 - 2025-01-05 17:30
Todas as datas
  • De 2024-07-06 16:00 a 2025-01-05 17:30
Local
Museu Ibérico de Arqueologia e Arte
Telefone
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E-mail
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